RPG "Old School" é um termo ironicamente recente. O movimento de reviver as primeiras edições do D&D foi uma resposta da comunidade de jogadores entusiastas da obra original de Gygax. Ele se propõe a retomar as regras e os jogos que foram sucesso na década de 70/80, quando o jogo ainda estava em suas origens.
Mas qual o motivo do chamado "OSR" (Old School Renaissance) ter ganhado tanta força e tantos adeptos? Qual a razão de ressuscitar regras obsoletas?
O objetivo deste artigo é definir a minha visão do OSR em geral. Embora ele possa destoar das visões de pessoas mais conhecidas, procurei embasar ao máximo minhas colocações. Além disso ela não busca ser polêmico ou tentar convencer alguém que este ou aquele estilo de jogo é melhor ou o mais correto. Longe disso, mesmo porque nada mais "old-school" que a regra de ouro do RPG, onde a diversão é o que importa.
Tomo 1: Origens
O movimento começou com as eternas "message boards" como Knights & Knaves e principalmente o influente Dragonsfoot. Na verdade, pouca coisa era realmente notória nos primordios. É sabido que AD&D, como RPG, dependem da criatividade do DM. Se o DM é criativo o céu é o limite e o grupo não precisa migrar de uma versão para outra. DMs deste tipo eram os protagonistas destas páginas, pois eles compartilhavam material de jogo criados por eles mesmos. Isso deu uma "sobrevida" fundamental às primeira edição do (A/O)D&D.
Com o advento da terceira edição, veio a licença aberta OGL. Pela primeira vez as regras básicas do então sistema d20 foram disponibilizadas e todos os termos contidos no System Reference Document (SRD) foram lançados sob uma licença aberta, permitindo que outras editoras lançassem seu próprio material de jogo com base neste documento.
Honestamente eu não sei quem teve a ideia, mas o fato é que alguém resolveu aplicar os algoritmos que movem a "mecânica" das primeiras edições do mesmo sistema agora lançado sob a OGL. De acordo com as leis de direito autoral de diversos países (incluindo EUA e Brasil), um algoritmo, por si só, não pode ser protegido pelos direitos autorais, apenas a sua apresentação.
Seguindo esta lógica o produto que apresenta o sistema do AD&D (i.e., os tomos PHB, DMG e MM), por exemplo, estaria protegido sob os direitos autorais. Ninguém pode simplesmente reproduzir o conteúdo de cada livro. Entretanto a mecânica de jogar 1d20 (ou 3d6, ou 1d4, etc) e comparar o resultado com alguma tabela numérica gerada por algum algoritmo nãp está protegida pelas leis de direitos autorais. Dessa forma, bastava alguns termos e apresentações estarem disponíveis para viabilizar o primeiro retro-clone do AD&D.
Então, seguindo esta lógica, tomos apresentando as antigas regras emuladas no SRD do sistema d20 foram os primeiros retro-clones. Pessoalmente, os títulos que conheço são OSRIC, Labyrinth Lord, Hackmaster e Swords & Wizardry. Esses títulos não apenas reapresentaram as regras antigas: elas permitiam que editoras lançassem material inédito compatível com as primeiras edições do jogo, todos sob a OGL.
Isso foi genial, pois permitiu que novos cenários, aventuras e personagens fossem referenciados a algo extremamente tradicional e popular nos EUA. O movimento OSR ganhou forças e diversas editoras lançaram suas próprias versões ou suplementos com aquele "feeling" dos jogos antigos, originalmente concebidos pela TSR em seu primórdio.
Tomo 2: OSR no Brasil
OSR vem do inglês Old School Renaissance, ou seja o renascimento de um jogo muito popular nos EUA. No Brasil o OSR teve uma importância ainda maior. Mesmo no dito "boom" dos anos 90, o AD&D já estava em sua segunda edição. Ou seja, no auge de sua popularidade o Brasil não teve chance de realmente conhecer as origens do jogo.
Na verdade, talvez eu esteja sendo um pouco injusto aqui com um título em específico: Tagmar. Ele foi fundamental em seu próprio tempo. Uma época que RPGs eram praticamente importados, o primeiro título brasileiro merece seu espaço no coração deste jogador que vos escreve. Além disso, Tagmar ainda vive pelo seu projeto Tagmar 2.
Voltando ao AD&D, nunca tivemos uma primeira edição por aqui. Então o OSR serviu para popularizar algo que não tivemos a oportunidade de apreciar em sua época. Conhecendo melhor a origem do jogo, podemos entender porque o D&D é tão popular e porque suas regras se transformaram tanto.
Além do projeto Tagmar 2, outro título que se tornou referência é o Old Dragon. Ele não é exatamente um retro-clone, pois muitas inovações (bem-vindas, por sinal) das edições mais modernas, um trabalho com uma lógica semelhante ao Basic Fantasy, que busca mais o "feeling" do jogo e simplicidade na mecânica do que emular fielmente as primeiras edições do AD&D (ou D&D).
Tomo 3: os Valores Old-School (e suas reais legitimidades)
Até agora vimos os aspectos práticos do movimento OSR: podemos criar e publicar jogos compatíveis com a primeira edição e lançá-las (comercialmente ou não) sob a OGL. Os retro-clones e simulacros são jogos completos e extremamente acessíveis, sempre buscando resgatar aquele clima "tosco" e primordial do nosso hobbie.
Dizem que o jogo Old-School privilegia a livre escolha do DM. No jogo Old-School, não existe uma real necessidade de ter cada regra descrita nas páginas dos livros, pois o Mestre seria incentivado a criar situações que, fatalmente, não estão descritas ali. Da mesma forma, os jogadores devem buscar a solução de problemas e enigmas usando a criatividade e o raciocínio, ao invés de buscar estatísticas de jogo em sua ficha de personagem.
Na prática, percebe-se que o jogo realmente fica mais solto. Menos dependentes daquilo que se lê nos livros ou o que está escrito na ficha. Mas, no fim das contas, existem valores exclusivos que podem fazer seu jogo ser Old School ou não? Este é o ponto controverso do movimento OSR. Existem questões que são respondidas de maneiras controversas pelos defensores e detratores do movimento:
- Será que estes valores só se fazem valer em jogos antigos?
- Afinal, estes pontos eram defendidos pelos jogadores da época ou apenas o delírio de um grupo de jogadores vivendo um passado idealizado?
Dificilmente haverá uma resposta certa e definitiva para isso. Particularmente, lendo as edições originais de Gygax em seu AD&D 1E, não vi grandes ressalvas incentivando o improviso. Entretanto, é dificil de ver grande flexibilidade em um sistema que coloca diversas regras sobre como uma interpretação de um sucesso num teste de perícia deve ser feito.
O que precisa ser colocado em questão é: por que a falta de regras das edições antigas é algo convenientemente encarado como algo permissivo enquanto que jogos mais modernos são essencialmente proibitivos para os defensores do OSR?
Esta é argumentação remete ao fato de que as regras completas do D&D atual são frutos de anos de game design. Mas, na sua essência a regra de ouro abraça as dois lados como uma grande mãe, pois o que define seu estilo de jogo é você mesmo. Assim, você pode ser um role-player extremamente criativo jogando D&D 4E ou um apelão de uma figa no AD&D 1E.
Portanto, se você não gosta de uma regra, ou se ela atrapalha o seu jogo mude-a ou exclua-a. Como DM, você pode fazer isso. Se o sistema não permite isso, busque outro, mas não condene a existência de uma regra sem antes dar uma chance a ela em jogo. Isso vale para qualquer sistema.
Os pontos ressaltados acerca da flexibilidade do DM em criar regras "sob demanda" da situação e o incentivo à criatividade do jogador em interpretar seus personagens "além-da-ficha" são mais do que válidos. Para mim, esses pontos são fundamentais para um jogo divertido. Dificilmente teria prazer em jogar com coisas diferentes disso. Mas tive jogos bons e ruins como jogador nos meus tempos de D&D Básico, em meados de 1990, por que seria diferente agora?
Conclusão
Para mim a grande virtude do OSR está em reciclar as regras do meu jogo favorito e lançá-las sob a OSR. Em outros tópicos disse que vários aspectos das edições mais recentes do D&D não me agradaram, especialmente "feats" e poderes diários para todas as classes. Então o aspecto prático de ter essas antigas regras apresentadas em módulos mais organizados é o grande fruto do OSR.
Em relação ao aspecto mais romântico do passado, podemos até ter algumas ressalvas em relação a isso. Entretanto, é inegável que muita coisa que foi deixada para trás não era de todo o mal ou necessariamente ruim. Muita da criatividade foi deixado para trás, não pelo sistema, mas sim pelos jogadores que interpretam estes novos sistemas. É sempre conveninete e agradável que alguém venha dizer o que pode realmente importar em um jogo sem vencedores. Neste ponto, os primeiros jogos são imbatíveis.
TAVERNEIRO LOUCO
não serve cerveja para Orcs nem Monges!
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